AINDA ESTAMOS NA MESMA DIREÇÃO?

"Duas pessoas andarão juntas, se não estiverem de acordo?"  (Amós 3:3 – NVI)

O versículo acima é uma pergunta retórica que dá início uma série de analogias feitas por Deus por meio do profeta Amós, no contexto de juízo contra Israel. Embora o povo desfrutasse de um tempo de prosperidade material, havia se distanciado moral e espiritualmente, rompendo sua aliança com o Senhor. Amós, profeta de Judá, denuncia os pecados do Reino do Norte — idolatria, opressão social, religiosidade vazia — e lembra que Deus sempre revela Sua vontade aos profetas antes de agir (Am 3:7). O rompimento no relacionamento com Deus torna impossível a comunhão. Assim como dois não andam juntos sem acordo, Deus não caminha com um povo que insiste em ignorar Sua vontade. Esse versículo, portanto, convida ao arrependimento e à restauração da aliança.

Embora não goste de tirar versículos de seu contexto, creio que, como essa pergunta não exige uma resposta literal, mas busca provocar reflexão, é possível utilizá-la de forma simbólica para tratar de outro tipo de aliança: o casamento. Assim como Deus fez uma aliança com Israel, o casamento é uma aliança feita diante d’Ele, com implicações espirituais profundas e duradouras. A pergunta de Amós nos convida a refletir: como dois podem andar juntos, se não houver concordância? Como um casal pode manter a comunhão sem diálogo, propósito e compromisso?

O casamento, assim como a aliança entre Deus e Seu povo, exige mais do que um ritual ou documento — requer acordo, entrega e disposição para caminhar lado a lado. A cerimônia e os votos marcam o início, mas o verdadeiro pacto se revela nas escolhas diárias, no esforço mútuo e no alinhamento de propósitos. A Palavra nos ensina que “melhor é serem dois do que um... se um cair, o outro o ajuda a levantar” (Ec 4:9-10). No entanto, essa ajuda só acontece quando os dois caminham na mesma direção, sustentados por princípios comuns. Sem isso, tornam-se companheiros de jornada apenas no papel, mas distantes no coração.

Muitos reconhecem a seriedade do casamento — sabem que, diante de Deus, ele é indissolúvel, monogâmico, profético, complementar e sacrificial (Mt 19:6; Ef 5:31-32). Mas poucos compreendem que para dois realmente caminharem juntos, precisam compartilhar valores fundamentais: visão de futuro, fé, ética e objetivos familiares. Casais que não conversam sobre esses pilares acabam seguindo trajetórias paralelas. O acordo no casamento não é ausência de conflito, mas compromisso com uma direção comum, mesmo com personalidades e opiniões distintas. Como diz Amós, sem acordo, não há caminhada conjunta.

Nesse caminho, a comunicação é indispensável. Ela é a ponte que sustenta o acordo. O desacordo por si só não destrói o relacionamento — o silêncio, sim. “Sejam todos prontos para ouvir, tardios para falar e tardios para irar-se” (Tg 1:19), aconselha Tiago. Quando o diálogo é rompido, os mal-entendidos se multiplicam e o afeto se esfria. Falar com verdade, ouvir com empatia e resolver os conflitos com humildade são atitudes que mantêm o casal unido. O verdadeiro acordo não é imposto, é construído, dia após dia, na base do respeito e do amor.

Por fim, vale lembrar que alianças não são condicionadas ao tempo bom. São feitas para resistir também à tempestade. O casamento é uma aliança que exige compromisso mesmo em tempos de crise. Assim como Deus permaneceu fiel à Sua aliança com Israel, apesar das infidelidades do povo (Os 2:19-20), o casal é chamado a permanecer fiel, mesmo quando surgem dificuldades. O pacto conjugal é mais do que emoção — é também espiritual e racional. “O amor tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (1Co 13:7). Andar juntos é uma escolha renovada diariamente, sustentada pela disposição de honrar a aliança diante de Deus. Nos dias difíceis, essa fidelidade é o que mantém os corações firmes e os passos alinhados.

Portanto, à luz de Amós 3:3, o casamento nos desafia a manter o acordo, cultivar a comunhão e renovar, em cada estação da vida, a escolha de seguir juntos no mesmo caminho — com fé, amor e propósito.

Diante de tudo isso, talvez a pergunta mais honesta que um casal possa se fazer hoje seja: "Ainda estamos caminhando na mesma direção?". O tempo, as lutas, os filhos, o trabalho e até mesmo o ministério podem nos levar a viver como dois viajantes na mesma estrada, mas em veículos diferentes — olhando para frente, mas sem perceber que o outro já ficou para trás.

Quem sabe, não é hora de parar, olhar nos olhos um do outro e, com humildade, perguntar: "Ainda temos um acordo? Ainda partilhamos os mesmos sonhos, a mesma fé, os mesmos valores que nos uniram no altar?" Porque, se não estivermos mais em concordância, então algo precisa ser restaurado — com urgência.

Não basta apenas permanecer juntos por aparência ou rotina. É preciso resgatar o propósito pelo qual Deus uniu vocês — e digo isso também como alguém que compartilha desse mesmo chamado. O verdadeiro amor vai além da convivência diária; é caminhar na mesma direção, com os mesmos valores e missão. Mais do que dividir um lar, é construir juntos algo eterno. E, se for necessário recomeçar, que seja com humildade, com diálogo sincero, com oração e com perdão no coração.

Talvez alguns estejam caminhando juntos apenas no corpo, mas distantes no espírito. Palavras foram silenciadas, feridas não curadas, gestos de amor esquecidos pelo tempo. Mas hoje é tempo de lembrar: o casamento é uma aliança sagrada, firmada diante de Deus. E enquanto há vida, há esperança. Ainda há graça para restaurar o vínculo, renovar os votos do coração e reencontrar a direção. O céu continua apontando o caminho para quem deseja, de verdade, andar lado a lado outra vez.

Então, respirem fundo e conversem. Orem juntos. Ouçam um ao outro com o coração aberto. E se a resposta à pergunta de Amós, no fundo, for “não”… que hoje seja o dia de dizer: “Sim, vamos voltar a andar juntos. No mesmo passo. Na mesma direção. Pela mesma fé. Para a glória do mesmo Deus.

Que Deus, nosso Pai, e o Senhor Jesus Cristo lhes deem graça e paz.

Pr. Décio Fonseca

02/qua/abr/25

Um comentário:

  1. Amém meu irmão é amado pastor, que o Senhor Jesus continue te abençoando e te usando poderosamente.

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