TEVAH — A
ARCA DO RECOMEÇO
Na narrativa bíblica, Deus frequentemente se vale de símbolos
concretos para revelar verdades espirituais profundas. Um desses símbolos é a
arca — ou, no hebraico, “tevah” (תֵּבָה) — que aparece em momentos-chave
da história da salvação. Curiosamente, essa palavra aparece apenas duas vezes
na Bíblia — e justamente em dois momentos cruciais de preservação e redenção: a
arca de Noé e o cesto de Moisés.
A primeira vez que encontramos o termo tevah na
Palavra é em Gênesis 6–9, na narrativa do dilúvio. Naquele tempo, o mundo
estava mergulhado em corrupção, e o juízo divino se aproximava em forma de
águas devastadoras. Contudo, em meio ao caos iminente, Deus instrui Noé a
construir uma arca — não apenas uma embarcação, mas um refúgio sagrado, um
instrumento de preservação e um sinal da graça.
A tevah seria o meio pelo qual a vida seria
protegida, não por mérito humano, mas pela direção e misericórdia do Senhor.
Ali, Noé e sua família seriam guardados, não apenas do juízo, mas para um novo
começo, um recomeço sob uma nova aliança. Deus não quis apenas poupar Noé;
desejava reiniciar a história da humanidade através dele. “Então o Senhor
disse a Noé: ‘Entre na arca, você e toda a sua família, porque você é o único
justo que encontrei nesta geração.’” (Gênesis 7:1, NVI).
Séculos depois, no livro do Êxodo, a palavra tevah
reaparece — agora de forma discreta, porém carregada de significado. Diante da
ameaça imposta pelo decreto de Faraó, Joquebede, mãe de Moisés, ao perceber que
já não podia mais esconder o filho, toma uma atitude de fé: confecciona um
pequeno cesto de papiro, veda-o com betume e piche, e o coloca nas águas do
Nilo. À primeira vista, pode parecer um ato de desespero, mas o texto hebraico
revela outra dimensão ao empregar novamente o termo tevah — o
mesmo utilizado para a arca de Noé.
A escolha desta palavra não é acidental. Assim como a arca
preservou Noé e sua família para um novo recomeço, o cesto guardaria Moisés,
que mais tarde se tornaria o libertador do povo hebreu. Em ambos os casos, a tevah
surge como símbolo do cuidado divino, um ventre simbólico de onde emergem vidas
destinadas a restaurar, libertar e renovar a aliança com Deus. “Tendo já
três meses, não podendo escondê-lo por mais tempo, pegou um cesto de papiro (tevah),
vedou-o com betume e piche, colocou nele o menino e o pôs entre os juncos à
margem do Nilo.” (Êxodo 2:3, NVI)
Em ambas as histórias, vemos que a tevah é mais do que uma
estrutura física — ela simboliza a mão cuidadosa de Deus, guardando vidas para
cumprir Seus propósitos. Deus não livra apenas por livrar; Ele preserva porque
está escrevendo uma nova etapa. Ele esconde para depois revelar com poder. Em
tempos de ameaça e caos, a tevah torna-se símbolo do cuidado divino, do
refúgio em meio ao julgamento e da esperança de novos começos. Noé sai da arca
para um mundo renovado; Moisés é tirado das águas para liderar um povo rumo à
promessa. A história que começou no Gênesis — com criação, queda e juízo —
continua no Êxodo, com libertação, redenção e aliança.
Essas imagens da tevah apontam para algo ainda
maior: Cristo, o verdadeiro instrumento de salvação. Assim como Noé foi
guardado da destruição dentro da arca, e Moisés protegido da morte no cesto de
papiro, nós somos salvos em Cristo — aquele que nos conduz da morte para a vida,
do juízo para a graça. Nele encontramos nosso refúgio, segurança e um novo
começo. A tevah de ontem era feita de madeira e betume; a de hoje
foi levantada sobre uma cruz e selada, não com betume, mas com o sangue eterno
do Cordeiro de Deus. “O Senhor é bom, um refúgio em tempos de angústia. Ele
protege os que nele confiam.” (Naum 1:7, NVI)
Jesus é a nossa tevah. Em Cristo, somos libertos,
transformados e enviados com um propósito. Ele é o nosso lugar seguro, a arca
da redenção onde somos preservados pelo poder da graça. Assim como Noé entrou
na arca e foi salvo das águas, e Moisés foi colocado no cesto e resgatado da
morte, nós fomos colocados em Cristo para sermos guardados da condenação eterna
e preparados para uma nova jornada - a Canaã Celestial. “Eu sou a porta; quem entra por mim será
salvo.” (João 10:9, NVI)
A nossa salvação não depende de nossa força ou das circunstâncias
que nos cercam, mas de onde estamos colocados. Se estamos em Cristo — se
habitamos na tevah que Deus preparou — então nada poderá nos
separar do Seu amor e do Seu propósito.
Talvez hoje você se encontre em um momento de insegurança, ameaça
ou silêncio. Talvez esteja sendo carregado pelas águas incertas da vida, como
Moisés no Nilo. Ou talvez esteja fechado dentro da arca, como Noé, esperando a
tempestade passar. Em qualquer dos casos, saiba: se você está em Cristo, está
seguro. Deus não apenas protege — Ele conduz. Seu livramento é também o berço
de algo novo. “Portanto, se alguém está em Cristo, é nova criação. As
coisas antigas já passaram; eis que surgiram coisas novas!” (2
Coríntios 5:17, NVI)
A tevah nos ensina que a salvação de Deus nunca vem
vazia: ela é cheia de propósito. Seja na madeira bruta da arca, no junco do
cesto ou na cruz de Cristo, o livramento sempre aponta para um recomeço.
Que hoje você possa confiar nesse Deus que preserva, prepara e
envia. E que, com fé, obediência e esperança, entre e permaneça na tevah
eterna — Cristo.
Que Deus, nosso Pai, e o Senhor Jesus Cristo lhes deem graça
e paz.
Pr. Décio Fonseca
25-ter-mar-2025
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